Quanto valem as crianças?
Por que certos interesses reagem, com
fúria mercantilizante, à lei que defende infância conta violência simbólica da
publicidade.
Por Lais Fontenelle
As crianças
estão sendo precificadas por um mercado que quer lucrar com sua
vulnerabilidade. Em reação à resolução do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente), que condena a publicidade infantil, a
Mauricio de Souza Produções encomendou pesquisa sobre os impactos,
pretensamente catastróficos, dessa proibição na economia do país.
Segundo ela, o
fim da publicidade dirigida à criança custaria ao mercado R$ 33,3 bilhões, 728
mil empregos e R$ 6,4 bilhões em salários, além de uma queda de R$ 2,2 bilhões
na arrecadação de impostos. Uma conta rápida revela que, considerando-se o
universo de 40 milhões de crianças com até 12 anos, cada uma delas custaria
cerca de R$ 825 – e que é de fato lucrativo explorar a vulnerabilidade
infantil.
O que a
pesquisa não leva em consideração é que a saúde física
e emocional das crianças não pode ser precificada. Os custos de qualquer tipo
de exploração da infância são sempre muito mais altos para a sociedade do que
qualquer conta. A infância é o prefácio de um mundo mais “lucrativo” em termos
sociais, ambientais e também econômicos – e se realmente acreditarmos nisso,
devemos protegê-las com absoluta prioridade.
A Resolução
163 do Conanda, publicada em abril, esclarece aquilo que o Código de
Defesa do Consumidor já prevê, ao dizer que toda publicidade dirigida às
crianças é abusiva e, portanto, ilegal. Ela pleiteia não o fim de produtos e
serviços infantis, mas o redirecionamento da mensagem comercial. Redirecionar a
publicidade para os adultos é uma postura ética, legal e lucrativa – já que,
quando as mensagens publicitárias são destinadas a indivíduos maduros, cientes
de seus direitos e deveres, o resultado tende a ser uma prática equilibrada de
consumo. São os adultos que devem decidir pelo bem de suas crianças e,
portanto, é com eles que a comunicação tem que acontecer.
Quando a
publicidade opta por dirigir-se estrategicamente às crianças, indivíduos em
estágio de formação e, portanto, mais imaturos e vulneráveis, seu poder de
influência não encontra praticamente nenhuma resistência. Os apelos emocionais
de um tsunami de comerciais e promoções encontram então correspondência direta
na afetividade infantil e o que ocorre é uma adesão imediata e persistente aos
infinitos “desejos” ofertados pela publicidade.
O resultado
desse ato é, antes de tudo, uma grande violência simbólica contra o bem-estar
das crianças, além de fator de desequilíbrio generalizado, já que a publicidade
é considerada uma das causas de problemas como obesidade infantil, exploração
sexual, consumo precoce de álcool e tabaco – questões que pesam sobre a
infância e toda a sociedade, a economia e o Estado.
Nenhum tipo de
desenvolvimento econômico, tecnológico ou científico deve ser mais importante
que o desenvolvimento biofísico, psicológico e educacional de uma única
criança. O custo econômico e social do consumismo está aí para quem quiser ver
– nos problemas ambientais, na violência, na falta de saúde de crianças e
adultos.
Reproduzido de Outras
Palavras
24 jan 2015
Leia também, "A batalha pela publicidade infantil", por Paloma Rodrigues (22/12/2014) na Carta Capital,clicando aqui.
Assista e reflita: Em depoimento a
Carta Capital, Ekaterine Karageorgiadis, advogada do Instituto Alana, explica a
publicidade infantil e seus malefícios.
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